Avançar para o conteúdo principal

[abril, águas mil]

Fotografia: Mafalda Rebelo


O dia acordou choroso, estamos de lágrima fácil, os dois, hoje.
O dia acorda triste muitas vezes e eu assustada outras tantas. 
A vida continua a acontecer normalmente, enquanto uns morrerem outros nascem, enquanto uns acordam outros dormem. 
A chuva cai avulso sem sinais de abrandar, o trânsito congestionado entope as ruas e o comércio enche-se de corpos frios e molhados. Uns querem um chá quente para aquecer, outros um café forte para arrebitar. 
Tenho a cabeça a mil, o corpo sem forças e os olhos afundados nas lágrimas que não param de chover sobre o meu rosto.
É aqui, perante um mundo em movimento que me apercebo que sou uma miúda. Não gosto de me imaginar mulher, quando falho, quando me falham, quando os dias começam e acabam sem a resolução do problema que tenho em mãos.
Sou mulher firme, no colo que dou aos outros, nas boas energias que lhes passo quando lhes dou a garantia de que amanhã vão acordar cheios de sol e sorrisos rasgados.
Sou miúda, quando a noite cai escura e chuvosa e me sinto despida sem coragem, quando não consigo parar de chorar e na ausência do colo que dei, fica a certeza daquilo que já conquistei.
Já deitada e enrolada no silêncio que me rodeia, eu, mulher que já foi miúda, e a noite que já foi dia, choramos juntas, num abraço longo cheio de esperança, amanhã já vai estar sol, vamos estar em Maio sem chorar.

Comentários

Enviar um comentário